domingo, 2 de outubro de 2011

deus não abençoa nelson rodrigues.

nelson rodrigues estava certo quanto ao complexo de vira lata brasileiro. sim, somos um exército de narcisos às avessas. e o pior é que não irá se reverter o quadro. e digo isso pelo recente aporte em terras brasilis de nossos bem condecorados artistas internacionais para o supra-sumo do vira-latismo brasileiro: o rock in rio.

sim, é um mega evento que, como cometas, acomete nossas plagas de tempos em tempos, ou seja, quando algum espertalhão quer ganhar um pouquinho mais de dinheiro. o nome, já sabemos, as intenções também, mas por que ainda caímos no conto do vigário, ou melhor, do profeta?

caímos porque sentimos a necessidade de partilhar com o mundo o pouco que ainda resta de entretenimento de massa. porque ainda queremos nos homogeneizar ainda mais, não podemos só comer burger king, usar nike ou termos facebook, temos que gravar em imagens tremidas, sofridas e distoantes de nossos celulares os shows internacionais do ano. como se num chamado por atenção, ou quem sabe até socorro, estivéssemos falando ao mundo: “sim! nós vemos os mesmos artistas que vocês ao vivo”. sim, vemos, ainda que paguemos bastante caro por isso. caro em cotas econômicas e de paciência.

o magnanismo da festa tem origem duvidosa, já que o titulo da redação não compreende muito bem os parágrafos. “quase rock in rio”? quase isso. para os mais puristas o fim, para os menos puristas, o começo. e é aí que a maionese talha. na jihad cotidiana todos pensamos que o nome tem que bater com o conteúdo. já outros inventam desculpas, patenteadas lógico, para dizer o contrário. “mas não é mais fácil mudar o nome do festival pra outra coisa?”. “a marca é registrada, não dá”. “então porque vocês não colocam realmente só rock?”. “porque não queremos”. e a discussão continua assim como uma espiral que acaba quando os fogos são soltos.

“lógico, iremos lhe dar metallica e tudo o mais, mas você vai ter que agüentar a claudia leite e ivete sangalo”. lógico que isso não se verifica, até pelo cronograma do audicidio, as retas paralelas não se encontram. mas há algo que incomoda aos mais puristas. justamente o puro, o saudoso, o antigo. o cidadão instigado se remete a um tempo em que as coisas eram diferentes, e como se num mundo que não parasse e não pudesse mudar, quer as coisas como estavam. "manteremos o nosso cantinho limpo". mas os tempos são outros, e os fluxos também. não há sustentação de um festival focado em um só estilo musical, porque sabemos das intensidades de nossas paixões, mas pouco vemos nossas precaridades quanto ao consumo. o rock de arena não mais se sustenta em nossas gramas sintéticas, porque apesar de parecer, a realidade quanto ao consumo do gênero maldito é parca. e daí surgem leites e sangalos, fentys e hudsons. para justamente sustentar o consumo. ainda que não nos atinja mecanicamente, as divas dissonantes afetivamente mancham nossas memórias de mercurys e dicksons.

o vira-latismo costura toda essa relação conflituosa – cara, esdrúxula e contraditória – já que todos os shows parecem mil maravilhas e que a tudo e todos agradam quando as luzes se apagam e a ribalta em festa anuncia o começo de uma ou mais horas de puro êxtase auditivo. parece que há no brasileiro, pelo menos no espectador, um problema sério de compreensão que há um profissionalismo musical em escala mundial. e pesa também achar que o show por se passar na cidade-chave brasileira e no cartão postal do “pátria” iria ser de alguma forma especial. não é especial, está alem disso, é profissional.

não nos iludamos quanto a qualidade do outro por justamente ele se tratar de outro. não há troca de espelhinhos para que possamos assistir um show de qualidade. se há no rock – sim, me refiro ao pouco de rock condizente com a capa do livro - de arena, de espetáculo e de grande estrutura uma coisa certa, esta é quanto a sua qualidade, e no nosso vira-latismo, acostumado com a mambembização das coisas, duvida muito que ele possa ser feito justamente para nós, pobres moradores da periferia do sistema, não merecedores de açoitadores tão bons.

o pior é isso, é duvidar do fator de homogeneização da cultura. como se não houvesse no mundo as mesmas bandas em palcos enormes e com os mesmos set-lists - que por increça que parível – agradam a todos. como se o entretenimento de massa não fosse um grande espetáculo de luzes e som em que todos nos sentimos confortáveis. ele o é, assim como o seu subway de domingo, a sua coca-cola cotidiana e seus filmes em dimensões alteradas. a globalização do serviço também atinge à cultura, já que a r$90 não podemos tratar algo como caro e sem valor.

há um valor lógico nisso tudo. tanto um valor de troca quanto um de uso. “ok, 90 reais? 3 shows bons pra você nunca esquecer”. e alguns ainda se assustam com isso, como se não fosse normal, como se não merecêssemos. "pago a mercadoria, mas não sei se vale a pena", essa é a síntese da inferioridade brasileira. e é aí que nelson rodrigues, do alto de seu efisema, estava certo.


pode ser que eu esteja errado, mas deus não abençoa nelson rodrigues. pois ele estava certo.

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