terça-feira, 22 de março de 2011

apesar dos pesares

lembro de quando eu era muito fã do henry rollins: começo de faculdade, uma pilha de nervos escutando black flag. uma adolescência musical que terminou tarde. eu via de tudo dele. lia artigo, assistia video, baixava dvd e ouvia tudo que ele tinha gravado e esperava ansiosamente por qualquer coisa que ele fizesse, porque seria o máximo.

hoje lendo um artigo sobre ele - e um pouco distante do mito - me lembrei que fora ele fazer aniversário no mesmo dia que a minha mãe, fez 50 anos. 50 anos. não sei bem porque me lembrei de forma tão intensa que o cara que eu idealizava há 5, 6 anos está mais que ficando velho, está velho. há caras assim como lemmy, que tem 65 anos, e que todos sabem que é uma lenda (e das velhas), e que ainda nos assusta com sua idade quando nos faz constatar o que continua fazendo. é difícil ver caras da idade de henry e lemmy escrevendo e falando em profusão e que em nenhum momento te fazem lembrar que no minímo possuem o dobro da sua idade.

mais ou menos ilógica ainda é a comparação que se tem. sim, lemmy é uma figura folclórica: o cowboy galês bebedor de bourbon e coca que mesmo diabético segue a mesma pesada rotina desde os 30 anos. e claro, henry se manteve longe de tudo que lemmy faz, fez ou vai fazer: bebidas, mulheres, jogos. abstêmio, incrivelmente em forma e com um jeito peculiar de evitar as senhoritas que não se encaixam no padrão. agora o que há para se ver em em dois pontos equidistantes de uma mesma galáxia? há uma paixão incansável pela música, uma defesa da solidão profissional e uma visão criticamente responsável do mundo. três das quais compartilho todas. e três das quais se vê um mundo não cada vez mais carente, mas mais rarefeito de lobos fora da matilha. não me equiparo aqui novamente com nenhum dos dois, muito menos idealizo todas suas ações e nem por último estou querendo provocar o levante dos malquistos. mas mais uma vez faço um esforço de leitura que gosto.

há um quê de auto-preservação nessas atitudes destrutivas - destrutivas aos olhos do resto do mundo abobalhado consumidor de mtv e twitter do eike batista - que provoca em mim uma esperança, e confesso do fundo do vórtice: uma das poucas que tenho. esperança não em uma salvação ou rendenção através do "mau-exemplo", mas sim uma esperança que mostra que não se precisa ser pasteurizado para viver num planeta que se auto-consome sem amanhã. não digo que há uma juventude em todos, não só porque desde 1922 acho esse termo ruim, mas há na verdade um - peço perdão de antemão pelo uso do termo já destroçado pelos imbecis acadêmicos - contra espaço que tende ter e gerar pessoas como rollins, como lemmy, como peréio e etc. contra espaço ainda que difuso, confuso e menos em rede do que se imagina, diga-se de passagem. não se desenha aqui a elegia à vitória dos lewis skolnick da misantropia ou gregorys house da vida real, mas sim uma constatação que há outras formas para além das ensinadas. que em um momento podemos ser muito menos do que os outros esperam e ainda sim continuarmos nossas vidas esquecendo o bullying mecanicamente programado para nos uniformizar.

estar fora da caixinha não é motivo de orgulho. não há aqui um recrutamento para o fracasso, mas apenas uma constatação que a verdade é a maior mentira que existe. não leve esse discurso como se fosse um manifesto hipster ou outsider, porque é justamente o contrário. não há um encaixe disforme, mas um encaixe diferente, um não-encaixe. não são indivíduos ou grupos tentando remar contra a corrente, mas sim pegando outra onda, que não urge de ser compartilhada e muito menos é proibitiva a haoles que discordam com as remadas estranhas. há esse pequeno lapso, uns dirão falha, na estrutura de um mundo que não é programado, ou programada, para justamente parecer errado, mas apenas diferente, que por mais que alguns se incluam fora do mar quarternário - incluindo este aqui - ainda nos surpreendemos como se nunca tivessemos sido lembrados, apesar de sempre termos existido. repito, tal constatação não é mais um passo à esquerda ou à noroeste de qualquer posição política, ideológica, econômica ou o que seja. não é mais uma bandeira hasteada, mas a ausência de uma bandeira. ainda que se tenha princípios, mesmo que não validados ou outorgados, eles não são contra-princípios e não fazem parte de uma dualidade ou que quer que tentem explicar.

quando lemmy, rollins, peréio, hitchens e outros exemplos chegam à idade que tem apesar dos pesares, há ainda espaço para todos e mais que isso, há um espaço para cada. apesar dos pesares. essa, digo mais uma vez, não é uma lição a ser aprendida e muitos menos uma vitória em embate algum, são apenas lembranças do que uma parte do mundo nós somos, porque ninguém aqui está competindo.

pode ser que eu esteja errado, mas nunca estaremos certos.