terça-feira, 20 de julho de 2010

pekar

meu aniversário foi na segunda. nada de especial. até me mexi um pouco mais que no resto dos dias dessa semana e da que passou. fazer aniversário nas férias dá sempre a falsa impressão de que se tem todo o tempo do mundo já que é julho e não tem mais nada pra fazer. mas na segunda até que acordei cedo, coisa que estranhamente o corpo vem forçando a mente a se acostumar, tratei de resolver umas coisas pelo telefone e me despachei pro saara no centro do rio pra comprar agasalho pra ir pra porto alegre. a mesma viagem monótona num ônibus novo e apertado que eu não fazia há um tempo. é incrível o quanto eles estão diminuindo os ônibus esses dias. quanto mais novos mais desconfortáveis. me esqueci de levar algo pra ouvir. desde que o harvey pekar morreu na segunda anterior eu voltei a ouvir jazz. fazia um tempo e o que eu tinha no computador já tinha escutado bastante. e naquela hora eu queria ouvir alguma coisa.

coltrane, duke ellington, horace silver, benny goodman, miles davis. os figurões. desde sábado me encascatei de ouvir mais coisa que não tinha ouvido ainda. eu tinha uma coletânea do ken burns boa. mas ainda faltava alguma coisa. fiquei pesquisando, lendo, procurando, baixando, tudo aquilo que o tempo livre oferece pra fazer. eu tava ainda numa onda meio blue note. pra baixo. essa chuva no fim de semana me desanimou. frustou meus planos. e no meio disso comecei a escutar de novo jazz. eu havia esquecido de quão bom era. só o instrumental e até uma billie holiday talvez. baixei aquele filme sobre o harvey pra saber mais do cara. eu tinha lido um tempão atrás a edição que a conrad fez. achei legal, mas como na época não manjava muito de inglês não fui a fundo. eu sabia que o pekar curtia jazz, até tentei ir atras de alguns artigos dele sobre logo depois, bota aí uns 3 anos. vi o filme e achei bem legal. o paul giamatti normalmente é bastante cretino atuando, mas nesse pareceu perfeito. não dá pra ver outro cara interpretando o pekar. a trilha sonora é muito boa. acompanha o nível ordinário do filme.

vendo o filme e voltando a ouvir jazz qualquer um iria se remeter a uma atmosfera melancólica de sadismo e auto flagelo só por achar que a chuva e o tempo frio faz as pessoas serem piores ou mais tristes. não sei se isso me atingiu em algum momento. acredito que sim. mas me lembrando de tudo que aconteceu não sinto remorso por pekar ter morrido, apesar ter admiração, ou não me senti estranho num dia que eu levei como se fosse normal, apesar da maioria quererem levar um dia tremendamente especial. acho que compartilho com pekar a frustração de não saber desenhar, mas em esses pequenos momentos, ainda que tristes, nos tornam mais humanos. nos mostra quem realmente somos. os nossos limites. harvey, coltrane, ellington, davis, todos eles fazem da arte algo mais real, mais humano, mais tangível. não há super heróis ou super escalas. há apenas música e contos cotidianos. banais. humanos. não há nada de estranho ou anormal. apenas o estritamente costumeiro. e em muitos momentos é isso que me falta.


pode ser que eu esteja errado, mas é normal se sentir errado.

domingo, 4 de julho de 2010

a fina arte de ser babaca

no últimos tempos, a onda da babaquice pedante - e aqui exerço a minha licença poética para o pleonasmo - tem atingido a todos que por um acaso se interessam por assuntos, digamos, mais políticos. não consigo datar por carbono quando começou, mas sei que não durou muito a novidade. aliás, ser babaca quando se fala de política não é tão pós90-neoliberal-psdbista assim. é só lembrar de paulo francis. um senhor babaca. um respeitado babaca. um doutor em babaquice. mas que dizia babaquices que faziam você pensar.

hoje entre mainardis, jabores, azevedos e leitões a babaquice ficou mais que demodé, ficou símia. a direita cínica - como salientou brilhantemente arnaldo branco - que detestávamos porém respeitávamos, perdeu lugar para histeria dos herdeiros dos estupradores do BNDES. aqueles barões da babaquice de antigamente hoje veêm - ou não - esses novatos com graduação na PUC e MBA na FGV gritarem que "odeiam! odeiam! e odeiam!" como se fossem bebês que não gostam de algo que ainda não comeram. ainda que continuem morando nos mesmos apartamentos no jardins e na gávea, falam como se estivessem vendendo o merlot-sauvignon do almoço pra comprar o camembert no jantar. um padrão raso e inadmissível até pro pessoal do terceiro escalão da vecchia scuola dos babacas.

o paulo francis, magno exemplo da babaquice dos bons tempos, era um babaca legal. ele estudava 14 horas por dia pra ser babaca. não trabalhou pra ser babaca. ele escreveu livros babacas. ele mudou de lado pra ser babaca. ele tinha aquela cara inchada de champanhe francês e filet mignon uruguaio pra parecer babaca. ele falava feito um babaca. ele morava em new york pra poder gritar que era babaca na times square. ele viajava para frança pra tomar vinho e causar inveja aos franceses por ser mais babaca que eles. ele fez TUDO pra ser babaca. ele era gabaritado pra ser um grande babaca. você podia olhar e dizer: "que legal, esse cara é babaca e se orgulha disso!". mas hoje não meu amigo, os novos babacas não tem nada disso.

jabor e mainardi - só pra citar os exemplos mais latentes - são babacas por falta de opção. ex-cineastas - acho que podemos pensar em estabelecer um padrão aqui, ou seja, podemos ver em alguns anos o josé padilha perfilando na istoé suas idiossincrasias - que não conseguiram enganar gente durante muito tempo e hoje apenas chateiam. são caras que a gente pensou um tempo serem bons. eu até gosto de "eu te amo" por causa do peréio, mas não consigo gostar de "mater dei" por causa do cara que parece o tom hanks. eles não são simpáticos e produzem asco até àqueles que são seus ávidos leitores, que por vez ou outra torcem o nariz e até assumem que seus ídolos cruzaram aquela linha "tênue" do estapafúrdio. estão sempre emburrados como se nunca tivessem sido compreendidos, esses pobres coitados, filhos de embaixadores e fundadores do arena. hoje escrevem meia dúzia de palavras chocantes como miséria, estupor, tragédia, estupidez associadas com dilma, stalin, lula, hitler em meia página. denunciam a senhora que limpa a mesa do acessor do gabinete de um vereador roraimense eleito com o mínimo de votos como a integrante de uma quadrilha que é a mais espetacular desde ronald biggs e seu bando.

conseguiram com pouco custo uma coluna aqui, um espaço na tv ali e ajudados pelo padrão informacional da world wide web - aqui por puro saudosimo, imagine o paulo francis pronunciando "www" - conseguiram estar no centro das grandes polêmicas que antigamente demoravam a aparecer. os babacas de antigamente escreviam sete, oito e até dez artigos antes de alguém começar a se importar em replicar. hoje não, a nova babaquice instantaneamente vira a "twitada" de sábado do humorista-jornalístico de voz fina e terno preto e se torna a capa da veja no dia seguinte. antigamente demorava. e era essa demora que fazia a babaquice tão boa. hoje somos inundados por uma avalanche de babaquice toda semana e não conseguimos lembrar da última, o que é até um ponto positivo, uma vez que o nível caiu e nós somos abençoados por não sermos esponjas cerebrais. é um suposto dossiê atrás do outro, denúncias contra ministros, o mais novo esquema no banco central, o mega desvio de dinheiro na receita federal e etc. não que não devam ser noticiados, mas no formato de quase clipping e de páginas de conglomerados de alcunhas de uma letra e um número que se atualizam a cada 2 minutos tudo parece ser meio teatral demais e bem "investigado" em tão pouco tempo. surgem aos montes os dossiês dos dossiês do superfaturamento da ração do gato da sobrinha da cunhada da vizinha do porteiro do prédio do quarteirão do lado do prédio do colega de maternal já falecido do senador de minas gerais. e aí a babaquice começa a perder a credibilidade. e olha que ela tinha muita.

vendo hoje, parece fácil ser um babaca. escrever uma coluna falando do medo que traz a máquina governamental usada por dilma roussef na campanha eleitoral é coisa boba. hoje um liberal eloquente que faz editorial no globo mais parece uma esposa de general que enlouquece ao saber que o filho tá fumando maconha, o que nos dias de hoje não é novidade para essas primeiras-damas do conflito bélico, já que o que mais preocupa é pedir pro filho cheirar cocaína só com os amigos brancos. e dentro do condomínio. até a galera babaca old-school que tá meia-bomba na ativa se espanta. como agora acontece de vez em quando, com o fernando henrique tendo que soltar uma pra acalmar os ânimos. os caras da antiga veêm essa galera nova e sabem que se não fosse pela agenda lotada de eventos da opus dei não deixariam esse pessoal novo continuar o latrocínio do pensamento hobbesiano-maquiavélico. todos eles sabem que se a idade não pesasse, as teorias que eles tanto estudaram em sorbonne e oxford não seriam massacradas por esses yuppies ex-bolsistas da ivy legue.

a babaquice não se modernizou, mas pelo contrário involuiu. a imagem que o arnaldo branco me fez perpetuar do reinaldo azevedo de tinta na cara que nem o rambo entrando no palácio do planalto com uma uzi me faz ter saudade do tempo que a gente não sabia qual era mais legal, imitar a voz do paulo francis ou a do silvio santos. onde foi que erramos ao deixar esses babacas vestidos com ricardos almeida começarem a tomar o lugar dos nossos babacas de ternos feitos por anciões italianos que viviam enclausurados em lojas de becos de milão? quando foi que escutar alguém imitar o silvio santos ficou tão chato como ver uma denúncia contra um ministro? quando foi que um vídeo de youtube substituiu uma folha inteira do globo escrita por um cardeal bicentenário? e pelo amor de qualquer coisa, quando foi que começaram a achar os irmãos caruso engraçados???!!!

pode ser que eu esteja errado, mas hoje os babacas somos nós.